Com os médicos, o corporativismo
se dá de outra forma, talvez mais perversa, pois é um corporativismo elitista,
cujo uso em excesso "pode levar à morte". Vejamos:
O Brasil tem 388.015 médicos em
atividade. Deste total, 275.310 (70%) estão concentrados nas regiões Sul e Sudeste.
Na Região Norte, são 16.538 médicos. A média nacional é de 2 médicos por 1.000
habitantes - duas vezes maior do que nas regiões Norte (1,01) e Nordeste (1,2
médico por 1.000 habitantes). Na melhor posição está o Sudeste (2,67), seguido
pela região Sul (2,09) e o Centro-Oeste (2,05).
Todos esses números podem - e
devem - ser conferidos em Demografia Médica no Brasil - Volume 2 - CFM/CREMESP
- Fevereiro 2013. O endereço está no Google.
Não faltam médicos no Rio de
Janeiro. Não faltam médicos em São Paulo. Faltam médicos no SUS, seja no Rio,
seja em São Paulo, e faltam médicos onde não há mercados para a especialização.
E por que faltam médicos no SUS?
Entrem em qualquer sala do sexto
ano e perguntem: quantos médicos aqui pretendem atuar na atividade básica? De
cada 50, se aparecer um será muito. Detalhe importante: todo esse debate dos
médicos importados de Cuba ou de Portugal gira em torno disso. Ninguém falou
até agora em importar especialistas, mas exclusivamente médicos que queiram
atuar na linha de frente, na chamada atividade básica, em áreas onde os médicos
brasileiros NÃO QUEREM ATUAR. Um não querer legítimo, mas com consequências
dramáticas, como a advertência nas embalagens de medicamentos.
A Prefeitura Municipal de Feijó, no interior
do Acre, por exemplo, está à procura de " 03 (três) médicos "clínico
Geral" (atividade básica) , que estejam dispostos a atuar em nossa cidade,
com o contrato de salário no valor de R$ 10.500,00 (Dez mil, e quinhentos
reais)". Observe que o mais importante nesse trecho do edital não é o
salário, mas a presença da expressão DISPOSTOS.
Pareceu-me uma súplica.
Interessados, de acordo com o
edital, devem entrar em contato com Rosaldo Firmo de Aguiar, Secretário
Municipal de Saúde, no endereço "Trav. Diamantino Augusto Macedo, S/H -
Cidade Nova - Feijó - Acre. CEP 69.960-000 - Fone/Fax: (68) 3463-3372 E-mail:
saude@feijo.ac.gov.br".
Nem sei se os médicos importados chegarão um
dia a Feijó ou a Caracol, no interior do Piauí. O que sei é uma criança que
nasce naquelas bandas está condenada a viver quase 10 anos a menos do que a
criança que nasce no Rio ou em São Paulo. (Taxa de fecundidade total, taxa
bruta de natalidade, taxa bruta de mortalidade, taxa de mortalidade infantil e
esperança de vida ao nascer, por sexo, segundo as Grandes Regiões e Unidades da
Federação - Síntese dos Indicadores Sociais 2010 - IBGE).
Isso é inaceitável e como tal
deveria ser também inegociável. Ou será que o artigo 5º da Constituição não
vale para o Piauí?