A bilionária indústria cinematográfica decidiu se precaver e anunciou que vai entrar de cabeça no mercado de distribuição de filmes pela Internet. Dois fatores fundamentaram a decisão: a expansão dos serviços de banda larga e o receio de que aconteça com os filmes algo parecido com o Naspter, um pesadelo que até hoje atormenta a vida e as finanças da indústria fonográfica. O curioso é que um argumento reforça – e muito - o outro.
A ameaça é real. Campeões de bilheteria que nem sequer foram lançados em VHS ou DVDs – como Hannibal, Shrek, Pearl Harbor e Lara Croft - Tomb Raider, entre outros - aparecem em cópias piratas na Internet ou em CDs. No mês passado, o alarme sou mais forte para os poderosos de Hollywood quando uma cópia de American Pìe 2 chegou à Internet duas semanas antes do lançamento oficial nos cinemas dos Estados Unidos.
O problema é tão grave a ponto de fomentar rankings dos filmes mais pirateados na rede. Um desses "top ten" é divulgado mensalmente pela MediaForce, uma empresa especializada em proteger copyright e rastrear conteúdos ilegais na Web. O ranking (disponível em www.mediaforce.com/news/topten), aponta a comédia Cara, Cadê Meu Carro? como a campeã de downloads piratas em julho, seguida de perto por Quem Vai Ficar Com Mary?, ambas produzidas pela Twentieth Century Fox.
Assim como o MP3 deu origem ao festival de trocas de arquivos musicais, o segredo da pirataria de filmes está no DivX, um padrão de compactação de vídeo, capaz de fazer com que um DVD de 5 gigabytes caiba inteiro em um CD comum. Com isso, está aberto o caminho para que o filme possa ser copiado, assistido (sem necessidade de um aparelho de DVD) ou “simplesmente” trocado, com o auxílio de programas como o Scour Exchange (http://www.scour.com/) ou o iMesh (http://www.imesh.com/) - semelhantes ao Napster, mas que também realizam trocas de DivX.
Baixar filmes gratuitamente na rede é uma prática relativamente antiga na Web – o próprio DivX surgiu ali pelo final de 99 - e apenas o tamanho dos arquivos, o tempo descomunal para o download e a baixa penetração da banda larga impediam uma maior disseminação. Com o avanço das tecnologias de transmissão, o principal entrave para que ocorra com os filmes o mesmo troca-troca que acontece com os arquivos musicais, cai por terra. E nos EUA, berço do Naspter e agora também do DivX, cerca de 18 milhões de usuários já contam com conexões em alta velocidade.
Até dá para fazer isso por linha discada, principalmente com o auxílio de programas que melhoram consideravelmente a velocidade de downloads. “Não duvide se alguém lhe falar que fez download do filme Matrix com resolução máxima e som digital em poucas horas!”, ressalta em bom português um site com um farto estoque de filmes, trailers e vídeoclips “disponíveis” em Divx. É a mais pura verdade. Não duvide.
Quanto custa e quanto vai custar?
No comunicado conjunto divulgado na semana passada, MGM, Paramount, Sony Pictures, Universal e Warner Bros não revelaram quanto pretendem cobrar pela “legítima distribuição de conteúdo na Web”. Disseram apenas que vão somar esforços para garantir “um nível adequado de proteção de copyright”, por meio de um software de gerenciamento de direitos autorais.
A MPAA, entidade que reúne os grandes estúdios norte-americanos estima em US$ 3 bilhões a perda anual de receitas do setor provocada pela pirataria (www.mpaa.org/anti-piracy). É cedo para sabermos se o monstro será domado. Mas, pelo menos, a indústria do cinema não vai fazer como os executivos musicais que só despertaram para o problema quando já existiam 50 milhões de usuários torcendo contra.
Harry Potter e Stephen King
Já que o assunto é ranking de pirataria, um bom endereço a ser visitado é o www.envisional.com, que traz a relação dos e-books mais “trocados” na Internet. São quase 7.300 títulos diferentes, incluindo vários best-sellers, com destaque para os grandes autores de ficção científica. De acordo com a Envisional, os quatro livros da série Harry Potter (J. K. Rowling) e Dreamcatcher, do mestre do terror Stephen King, estão entre os mais pirateados na Internet.
Também na literatura, o modelo que possibilita a disseminação ilegal de e-books é semelhante ao que é utilizado na troca de arquivos digitais ou de filmes, todos inspirados no Naspter e no tão falado peer-to-peer.
A Envisional, criada por ex-estudantes da Universidade de Cambridge, desenvolveu uma tecnologia de rastreamento de conteúdos ilegais, batizada como Sistema Automático Anti-Pirataria (AAPS, na sigla em inglês). Ao identificar um endereço com material irregular, o software manda emails de alertas para o autor do original e para os responsáveis pela infração. O site da empresa não menciona a taxa de sucesso da estratégia.
Coluna publicada originalmente em O Estado de S. Paulo, em 30/08/2001
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